RIBEIRO, Darcy. Introdução. In: ______. O Povo
Brasileiro: A Formação e o Sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das
Letras, 2006. p. 17-23.
O povo brasileiro foi formado “da confluência, do entrechoque e do caldeamento” de portugueses, indígenas e africanos. O resultado disso foi a geração de um povo novo, diferente daqueles que o originaram, mestiçado e culturalmente sincrético, alegre, apesar de sacrificado (p. 17).
![]() |
Fonte da imagem: Portal C3 |
O Brasil também é velho, por se enquadrar no modelo do capitalismo internacional como proletariado externo, que gera lucro para outros desde o período colonial.
![]() |
Fonte da imagem: Canal do Educador |
A
cultura brasileira é uma variação da
cultura portuguesa modificada pelos indígenas e pelos negros. É essa modificação
que torna nossa cultura única.
Apesar
de ter origens diversas, a sociedade brasileira se manteve unificada, em vez de
se pulverizar, como aconteceu com as ex-colônias da Espanha nas Américas.
A
unidade étnica básica do povo brasileiro não se tornou uniformidade, porque a
ecologia, a economia e a imigração foram forças que contribuíram para a
ocorrência das diferenciações regionais. Os sertanejos do Nordeste, os caboclos
da Amazônia, os crioulos do litoral, os caipiras do Sudeste e os gaúchos do Sul
são exemplos de tipos brasileiros gerados por essa diferenciação.
Em
contrapartida, a urbanização, a industrialização e os meios de comunicação são
forças que atuam no sentido da uniformização cultural dos brasileiros, apesar
de não conseguirem apagar suas diferenças regionais.
A
despeito das diferenças regionais e culturais existentes no Brasil, os
brasileiros se sentem como pertencentes a uma mesma etnia, devido à
uniformidade da língua, que é diferenciada somente por sotaques regionais, e
pelo compartilhamento de tradições comuns. Essa é uma etnia nacional, por estar
localizada em um território próprio, dentro de um mesmo Estado, e por não haver
entre nós rivalidades regionais e conflitos interétnicos capazes de ameaçar nossa
unidade.
Por
baixo da unidade cultural e nacional brasileira, existem “disparidades,
contradições e antagonismos”. A unidade nacional foi um objetivo conquistado pelas
nossas elites a partir de lutas e da política. Assim, após a independência, o
Brasil não se desintegrou como as antigas colônias da Espanha nas Américas (p.
20).
A
unidade territorial brasileira é fruto do combate violento às identidades
étnicas diferenciadas e aos movimentos potencialmente separatistas. Mesmo
movimentos que não buscavam a separação, mas sim a construção de uma sociedade
melhor foram considerados separatistas e massacrados, como o que ocorreu no
arraial de Canudos, no interior da Bahia.
A
unidade cultural do nosso país esconde o abismo social que separa ricos e pobres
e o antagonismo de classes dele decorrente. Para Ribeiro, esse abismo é maior
do que aquele que separa brancos e negros.
O
povo brasileiro não é fruto de um processo social em que grupos opostos se juntam
voluntariamente para formar um país, mas da exploração violenta da mão de obra
escravizada, primeiro indígena e depois africana, por brancos europeus. Essa
exploração se constituiu como genocídio e etnocídio ao longo de nossa história.
Isso intensifica a distância existente entre os ricos e os pobres e entre os
pobres e os miseráveis, sendo que a unidade territorial e cultural do nosso país
esconde a tensão entre esses grupos.
As
elites, “primeiro lusitanas, depois luso-brasileiras e, afinal, brasileiras”
sempre tiveram medo da ascensão dos pobres e dos miseráveis, pois imagina que, caso
esses grupos cheguem na sua posição, se voltem contra ela. Por isso, as elites
nacionais sempre atacaram qualquer
tentativa de ascensão de quem está abaixo dela (p. 21).
A
oposição entre ricos e pobres é tão forte que não há “comunicação propriamente humana
entre a massa do povo e a minoria privilegiada, que a vê e a ignora, a trata e
a maltrata, a explora e a deplora, como se essa fosse uma conduta natural”.
Essa estratificação social possui um colorido racial e é extremamente desigual
(p. 21).
![]() |
Fonte da imagem: Brasil Escola |
O abismo social passa despercebido pelos brasileiros e não gera conflitos que buscam superá-lo. Ele se cristaliza num modo de vida que separa os ricos dos pobres como se fossem castas e guetos. Os ricos se afastam cada vez mais dos pobres, ignorando-os. Os pobres veem os privilégios dos ricos como uma bênção de Deus, não como frutos da exploração contra si, e sonham em alcançar essa bênção.
Durante toda a história, a classe dominante usou da violência contra as camadas que estão abaixo dela e não houve movimento social capaz de fazer frente a isso. Falta compreensão de como se processou a história do Brasil e a formulação de um projeto de sociedade diferente, que seja apoiado pela maioria dos brasileiros. Essa nova sociedade brasileira não pode ser construída pelo reformismo institucional, porque, sempre que algum grupo político tenta seguir essa via, as elites se voltam contra ele com repressão e força.
Nenhum comentário:
Postar um comentário